Enfrentar quatro horas de viagem de carro em plena madrugada, pegar o primeiro voo, enfrentar fila de credenciamento, de cadastramento, fila para pegar taxi, tomar chá de cadeira e ainda percorrer gabinetes em busca de parlamentares que nem sempre estão disponíveis. Vida de prefeito em marcha pela capital federal é cheia de transtorno e esse esforço nem sempre garante que o chefe do Executivo municipal conseguirá assegurar benefícios para sua cidade. Afinal, centenas de outros prefeitos estão na mesma situação e disputam espaço entre audiências, reuniões e discursos.
Sidney Salomé (PMDB) é prefeito de Araputanga, cidade de 15 mil habitantes no oeste do Mato Grosso, como muitos outros colegas, passou pelas intermináveis agendas em Brasília em busca de recursos para sua cidade. Prefeito de primeiro mandato, Salomé está atrás de aportes para construção de casas populares, serviços de pavimentação e infraestrutura. O iG acompanhou parte de seu dia em Brasília. A jornada rumo à capital federal começou ainda na madrugada anterior.
Salomé conta que saiu de Araputanga por volta das 23h de segunda-feira. Fez os 354 quilômetros que separam a cidade de Cuiabá de carro durante a madrugada para chegar à capital do Mato Grosso pouco antes do início da manhã. Fez o percurso em 4 horas e teve de aguardar por mais de uma hora no aeroporto até embarcar no voo para Brasília pontualmente às 5h30. Chegou na cidade às 7h30. Disputou taxi no aeroporto, que já tinha movimento acima do normal por causa da chegada de outros prefeitos. A passagem pelo hotel foi meramente para largar a mala no quarto. O horário é apertado e não há tempo a perder se ele quiser chegar a tempo do ato de abertura da 17ª Marcha de Prefeitos.
Audiência relâmpago
Os grandes parceiros dos prefeitos nessas ocasiões são os congressistas. São deputados e senadores que ajudam as lideranças locais a agendar reuniões nos ministérios, autarquias e estatais e a transitar no Congresso. E essa relação transcende os limites partidários. “Quando você vem buscar melhorias para o município não se pode apenas falar com aqueles que são do seu partido”, diz Salomé, que antes de partir rumo aos percalços que o aguardavam na Esplanada dos Ministérios participou da abertura da Marcha dos Prefeitos em um centro de convenções. O ato terminou pouco depois do meio-dia e Salomé aproveitou para almoçar.
Deputados estaduais também ajudam prefeitos a conseguir encontros com autoridades federais. Ezequiel Fonseca, que também é presidente do PP do Mato Grosso, fez o meio-campo para que Salomé pudesse participar de audiência com o ministro das Cidades, Gilberto Occhi, indicado pelo PP. E ao chegar no ministério no início da tarde, o prefeito de Araputanga descobriu que a tarde seria longa. Ficou 1 hora e meia na sala de espera do gabinete ministerial, dividindo espaço com uma porção de colegas que traziam consigo demandas variadas.
Logo as rodinhas se formavam e Salomé se agrupou com outros prefeitos de sua região. Todos tomaram um chá de cadeira, afinal, tiveram de disputar a agenda do ministro com o governador de Minas Gerais, Alberto Pinto Coelho (PP), que tratava de detalhes a respeito da obras de expansão do metrô de Belo Horizonte. Água, café e muita paciência, pois ainda que tenham sido convidados a entrar no gabinete do ministro, o atendimento começou a ser feito pelo segundo escalão. Diretores técnicos receberam a leva de prefeitos que tinha Salomé como integrante. Outras levas ainda passariam por lá.
Ministro mesmo, Salomé viu muito rapidamente. Occhi não gastou mais do que 15 minutos com os prefeitos que se empoleiravam no gabinete. A maior parte do tempo da reunião foi gasto com Maria do Carmo Avesani, diretora do Departamento de Produção Habitacional da Secretaria Nacional de Habitação do Ministério das Cidades. Mesmo assim, o prefeito de Araputanga não perdeu o olhar otimista da situação. “Não é todo dia que a gente consegue falar com um ministro. Então eu esperaria até 24h se fosse necessário”, brinca Salomé.
Filas, espera e desencontros
Salomé conta que finalizou a reunião no ministério das Cidades sem uma solução. “A gente não sai com o problema resolvido, mas por outro lado consegui muito informação”, resume ele. Francis Maris Cruz (PMDB), prefeito de Cáceres, também no Mato Grosso, participou do mesmo encontro. Ao lado de Salomé, ele diz que as informações são importantes uma vez que muitos prefeitos chegam com projetos debaixo do braço que carecem de adequações técnicas. Salomé ouve a intervenção do colega e acena positivamente com a cabeça para finalmente opinar. “A gente troca muito informação até entre nós prefeitos. Hoje mesmo conheci por meio de um colega uma máquina usada para pintar o meio fio. É importante essa interação", diz ele.
A saída do ministério também é disputada. O fluxo anormal de pessoas transitando gera disputa pelo elevador, por taxis, esperas e filas, muitas filas. De lá, Salomé aproveitou a proximidade para iniciar o giro pelos gabinetes dos deputados ainda naquele dia, embora o plano fosse começar as visitas somente no dia seguinte. Ao chegar ao Congresso, mais filas. Os prefeitos precisam se identificar para ter acesso ao prédio e depois mais fila para um espaço nos elevadores.
O prefeito de Araputanga escolheu o gabinete do deputado Júlio Campos (DEM-MT) para iniciar seu giro. E logo de saída, já deu com a cara na porta. Campos não estava por lá e mais uma vez Salomé teve de se apegar à aparentemente interminável paciência. Ao lado de outros colegas da região, o prefeito veio pedir informações sobre emendas. E nesse caso, a notícia dada por um assessor foi desanimadora, a emenda não foi contingenciada. "Muitas vezes perdemos (prefeitos) emendas por contingenciamento", diz Salomé. "Essa notícia frustra um pouco a gente"admite ele.
Salomé ainda visitaria o Senado antes de voltar para o hotel para o jantar e finalmente encerrar um dia que até ali já durava 20 horas ininterruptas de andanças, filas, viagens, discursos e conversas. Na manhã seguinte, o prefeito já tinha agendadas novas visitas aos gabinetes de congressistas. "Quando a gente procura um parlamentar, não é só a emenda, a gente também procura o apoio político dele. Para ele acompanhar a gente num ministério, para ele orientar a gente qual o caminho e a gente tem feito essa peregrinação toda vez que vem a Brasília", afirma ele.
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